sábado, março 21, 2009

eu precisava deter a vontade de voltar atrás ou ficar parado, pois tem um ponto, eu descobria, em que você perde o comando das próprias pernas...
"Acho que o fato de ser só é inevitável, independe de fatos externos. Há pessoas que nascem para serem sós a vida inteira. Eu, por exemplo. Acho que mesmo que um dia case e tenha uns dez filhos (coisa que não me atrai nem um pouco, diga-se de passagem), ou mesmo que consiga encontrar a amizade que sonho - e de cuja existência a cada dia mais e mais duvido -, acho que mesmo que aconteçam essas coisas, continuarei só. Claro que há a minha própria companhia, este diário, os livros que leio, as drogas que escrevo de vez em quando - mas tudo como que circunscrito em um círculo completamente fechado. Frequentemente me assusto, pensando que a vida vai acabar sem que e encontre um grande amor ou uma grande amizade, ou mesmo uma grande vocação que justifique esse isolamento. Mas nada posso fazer,e ssas coisas acontecem sem que a gente as procure. O melhor a fazer é deixar "lavrado o campo, a casa limpa, a mesa posta, com cada coisa em seu lugar", como disse o poeta. E mesmo assim, talvez eu continue a fazer as refeições sozinho durante toda a vida. Muitas vezes tentei dizer essas coisas às pessoas. É tão dificil. Se elas são adultas, o que fazem é sorrir meio de lado, como quem diz: 'Mas isso faz parte do jogo'. E se são da minha idade, me olham com um olhar onde se reflete o meu próprio desamparo, dizendo palavras que a minha voz também poderia pronunciar."

Caio Fernando Abreu

"Que vontade, que vontade enorme de dizer outra vez meu amor, depois de tanto tempo e tanto medo.
Que vontade escapista e burra de encontrar noutro olhar que não o meu próprio - tão cansado, tão causado - qualquer coisa vasta e abstrata quanto, digamos assim, um Caminho.
Esse, simples mas proibido agora: o de tocar no outro.
Querer um futuro só porque você estará lá, meu amor.
O caminho de encontrar num outro humano o mais humilde de nós.
Então direi da boca luminosa de ilusão: te amo tanto.
E te beijarei, em puro engano de instantes enganosos transitórios - que importa?"