quinta-feira, dezembro 20, 2007

Caio Fernando Abreu - Fragmentos 2

"Tudo dói, e eu já nem sei mais para onde ir nem o que fazer, se ao menos - você me amasse um pouco, não estaria aqui e agora. neste bar. sozinho. longe de você e de mim."[ o inventário irremediável - o rato ]

Então, o que devo fazer é esperar. Sem desespero, sem melodrama, sem niilismo - esperar. Mas até quando, meu Deus, até quando? conto - limite branco.

"O silêncio tornou-se tão denso que cada movimento precisava ser feito devagar, como se o ar pesasse à nossa volta, dificultando os gestos. Quis pensar então na minha vida antiga, mesmo uma nem muito remota, que fosse pelo menos até pouco antes do pôr-do-sol quando, ao voltar para casa, do caminho cercado de hibiscos que liga o portão de entrada à varanda, enxerguei Virgínia ajustando a luneta para observar Vênus. Não consegui lembrar mais nada. Eu não tinha passado. Acho que pensei que não tivesse talvez também futuro."

"Sobrevivo a cada manhã quando, cruzando as portas e corredores que me conduzem às ruas intermináveis, imagino sempre que sou invisível para cada um dos que passam." Fotografias - Morangos Mofados.

"- Podia esperar de qualquer um essa fuga, esse fechamento. Mas não em você, se sempre foram de ternura nossos encontros e mesmo nossos desencontros não pesavam, e se lúcidos nos reconhecíamos precários, carentes, incompletos. Meras tentativas, nós. Mas doces. Por que então assim tão de repente e duro, por quê?"

- Seria isso, então? Você só consegue dar quando não é solicitado, e quando pedem algo você foge em desespero. Como se tivesse medo de ficar mais pobre, medo de que se alcance seu centro e nesse centro exista alguma coisa que você não quer mostrar nem dar ou dividir. Contido, dissimulado, você esconde essa coisa, será assim?"
[Diálogo, INVENTÁRIO DO IR-REMEDIÁVEL]

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