domingo, março 09, 2008

Pablo Neruda

Posso escrever os versos mais tristes esta noite.
Escrever, por exemplo: "A noite está estrelada,
e tiritam, azuis, os astros, ao longe".
O vento da noite gira no céu e canta.

Posso escrever os versos mais tristes esta noite.
Eu o amei, e às vezes ele também me amou.
Em noites como esta eu o tive entre os meus braços.
Beijei-o tantas vezes sob o céu infinito.
Ele me amou, às vezes eu também o amava.
Como não ter amado os seus grandes olhos fixos...

Posso escrever os versos mais tristes esta noite.
Pensar que não o tenho. Sentir que o perdi.
Ouvir a noite imensa, mais imensa sem ele.
E o verso cai na alma como no pasto o orvalho.
Que importa que o meu amor não pudesse guardá-lo.
A noite está estrelada e ele não está comigo.

Isso é tudo. Ao longe alguém canta.
Ao longe. Minha alma não se contenta com tê-lo perdido.
Como para aproximá-lo o meu olhar o procura.
Meu coração o procura, e ele não está comigo.
A mesma noite qeu fez branquear as mesmas árvores.
Nós, os de então, já não somos os mesmos.
Já não o amo, é verdade, mas quanto o amei.

Minha voz procurava o vento para tocar o seu ouvido.
De outro. Será de outro. Como antes dos meus beijos.
Sua voz, seu corpo claro. Seus olhos infinitos.
Já não o amo, é verdade, mas talvez o ame.
É tão curto o amor, e é tão longe o esquecimento.
Porque em noites como esta eu o tive entre os meus braços,
a minha alma não se contenta com tê-lo perdido.
Ainda que esta seja a última dor que ele me causa,
e estes sejam os últimos versos que lhe escrevo.

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